Helvetica e o metrô de Nova York [Parte 1/3]

Aloha

Bom, após um breve período de ferias (forçadas), o LOGOBR retorna com um presente espetacular a todos os seus leitores e colaboradores: a tradução na íntegra e com total autorização do principal artigo escrito até hoje pelo grande nome da tipografia mundial Paul Shaw. Esse cara, com mais de 20 anos de carreira, já faz trabalhos para Avon, Rolex, Lord & Taylor e  Origins. Ele nos autorizou a traduzir e publicar  seu artigo sobre a história tipográfica do metro de Nova York. Um verdadeiro dossiê, que depois virou livro e com o LOGOBR citado.

Sem dúvida, é uma grande honra para nós.

Como se trata de um artigo muito grande, resolvemos publicá-lo em três partes. Quero desde já agradecer a Dani Catelucci que está fazendo um trabalho fantástico na tradução e especialmente ao Paul que foi muito gentil em nos responder e mais gentil ainda nos dar essa incrível oportunidade.

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por Paul Shaw

A (quase) verdadeira história da Helvetica com o Metrô de Nova Iorque
Por Paul Shaw

Há um senso comum em acreditar que a Helvetica é a fonte da assinatura do sistema de metrô de Nova Iorque, crença esta reforçada por Helvetica, popular documentário de Gary Hustwit lançado em 2007 sobre esta fonte. Mas isso não é verdade – ou, melhor dizendo, isso é somente parte da história real. A Helvetica é a fonte oficial do MTA hoje, mas não foi a fonte especificada pela Unimark International quando esta criou o novo sistema de sinalização no final dos anos 60. Por que a Helvetica não foi escolhida a princípio? Que fonte foi escolhida em seu lugar? Por que a Helvetica é usada hoje, e quando ocorreu esta mudança? Para responder a estas perguntas, este artigo explora histórias muito importantes: do sistema de metrô de Nova Iorque, da sinalização de meios de transporte dos anos 60, da Unimark International e, é claro, da Helvetica. Estes quatro caminhos entrelaçam-se, em nove páginas, para apresentar a história que atualmente transcende a simples questão da Helvética e o metrô.

O Labirinto

Como qualquer morador de Nova Iorque – ou visitante da cidade – sabe, o sistema de metrô é um labirinto. Isso porque ele é uma mistura de três sistemas separados, dois dos quais foram incorporados de antigas linhas de trem urbano. O sistema atual de metrô de Nova Iorque foi formado em 1940 quando as linhas IRT (Interborough Rapid Transit), BMT (Brooklin-Manhattan Transit) e IND (Independent) foram unidas. As linhas do IRT são de 1904, as do BMT são de 1908 (quando se chamava BRT, ou Brooklyn Rapid Transit), e as do IND são de 1932. Pedaços das linhas IRT e BMT são originárias de linhas de trem elevadas, algumas datando de 1885.

Os primeiros “sinais” do sistema de metrô de Nova Iorque foram criados por Heins & LaFarge, arquitetos do IRT. Em 1904 eles determinaram a tradição de utilizar mosaicos para compor os nomes das estações nas paredes das plataformas, técnica hoje bem conhecida. Os painéis eram formados de pequenos ladrilhos em fontes Serif e Sans Serif Roman em caixa alta. Nem a linha tinha um estilo uniforme de tipografia, mesmo com os projetos sendo preparados em estúdio e então despachados por partes para as estações. Desta forma, há uma surpreendente quantidade de variedades nos mosaicos de nomes das estações. Sinalizações menores de direção – com setas indicando as saídas de cada estação – também foram feitas em mosaico, tanto com caixa alta de Serif como Sans Serif Roman. Vickers simplificou as bordas decorativas ao redor dos painéis, mas não alterou o estilo das fontes nem no IRT nem no BMT. Porém, quando o IND foi implementado em 1925, ele criou um novo estilo de maiúsculas Sans Serif para acompanhar a decoração das estações. Estas letras, inspiradas pelo Art déco, eram mais pesadas e mais geométricas que a Sans Serif do século 19. Eles usaram ladrilhos maiores que os dos mosaicos dos IRT e BMT, apesar da sinalização de direção do IND empregar letras Sans Serif em caixa alta mais leves e serem compostas por ladrilhos menores.

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Sinalização em mosaico do metrô (de cima para baixo):

1 train, Rector Street (1918)
1 train, South Ferry (1904);
N/R/W, Prince Street (1917);
“To 19th,” 1 train, 18th Street (1918)
L, Morgan Avenue (1928)
“Down town,” 4/5/6, 86th Street (1917)
“Up town,” R/W, Whitehall Street (1918)
E/F/G/R/V, Grand Avenue, Newtown (1936)
M/R, F connection to 9th Street (1915)
BMT, Fourth Avenue (1933).

Heins & LaFarge também “eram obcecados por sinalizações de porcelana esmaltada sobre as plataformas dos trens expressos, usando tipografia preta (na verdade, manuscrita) em um fundo branco, e pintando os nomes das estações nas colunas de ferro fundido”. Estes foram substituídos em 1918, quando Vickers determinou a sinalização esmaltada da Nelke Signs (que virou Nelke Veribrite Signs) e da Baltimore Enamel Company. As duas empresas continuaram produzindo as sinalizações esmaltadas durante a década de 30, colocando-as nas vigas-mestre e nas colunas de aço fundido. O objetivo de Vickers era tornar fácil para os pedestres reconhecer a parada ao chegar numa estação. Os nomes abreviados em sinais de porcelana esmaltada eram renderizados em caixa alta Sans Serif condensada, derivados dos modelos comuns de pintura de sinais. Para o IND, Vikers também adicionou um segundo conjunto de ladrilhos modulares para os nomes das estações. Estes eram integrados nas paredes das estações ao invés de serem fixados nas colunas das plataformas. A escrita destes sinais era em Spur Serif – comum nos manuais de pintura de sinalização do século 19 -, que lembra as fontes de convites sociais, como a Copperplate Gothic.

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Sinalização em porcelana esmaltada: (do canto superior esquerdo para o inferior direito)
A/C/E, Canal Street (1932) (cortesia de Joe Testagrose & Dave Primann)
“Bl’kr”, trem 6, Bleecker Street (1904)
A/C, Clinton/Washington (1936).

A partir do começo dos anos 50, as estações foram sistematicamente adaptadas para acomodar trens novos e maiores. As paredes das estações foram cobertas com ladrilhos simples em verde, ocre, azul e outras cores sólidas. Os nomes das estações foram impressos nos ladrilhos em preto, geometricamente formando letras Sans Serif condensadas (a estação Grand Street, porém, utiliza letras Delft azuis).
Como se a abundância de padrões de sinalização não fosse suficiente, o sistema de metrô também tinha uma variedade atordoante de outros sinais em porcelana esmaltada e pinturas à mão. Os sinais em porcelana, pendurados no teto ou colocados nas paredes, eram tanto direcionais quanto informativos. Os sinais de direção incluíam aqueles do lado de fora das entradas das estações, assim como os que ficavam nos corredores e plataformas subterrâneos. Muitos dos sinais informativos advertiam a respeito de comportamento criminoso, perigoso ou danoso à saúde: “Proibido vender mercadorias”, “Proibido debruçar sobre os trilhos”, “Proibido atravessar pelos trilhos”, “Proibido fumar”, “Proibido cuspir”. Os sinais direcionais e informativos eram produto da Manhattan Dial Company. A maior parte deles era escrita com algum tipo de letras maiúsculas Sans Serif – regular, condensed, square-countered, chamfered, outlined -, apesar de haver algumas letras Braketed ou Slab Serif Roman. Estas normalmente eram letras brancas em um fundo colorido (normalmente verde escuro para o IND e azul escuro para o IRT e para o BMT), mas também podiam ser em preto sobre um fundo branco. Não havia estilo definido.

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Sinais informativos: (do canto superior esquerdo para o inferior direito) IRT, provavelmente na linha 4, norte do 149th/Grand Concourse, Bronx
“Spitting” (c. 1938)
Washington Heights, provavelmente no Columbus Circle, A/B/C/D (c. 1930s).
(Museu do Trânsito de Nova York
).

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Sinais no E/F/G/R/V, Forest Hills/Estação 71st Avenue (1936).

Sinais pintados à mão foram inseridos no sistema de metrô no começo de 1930 – talvez até antes – e continuaram sendo usados por décadas (na verdade, alguns ainda podem ser vistos hoje em estações como a Forest Hills/Continental Avenue no Queens). Alguns foram intencionalmente temporários – escritos em cavaletes de pintura – e outros foram permanentes. Estes últimos normalmente eram informativos – como a localização de sanitários – e pintados em paredes do corredor em letras vermelhas e pretas, em caixa alta. Há evidências de que, quando estes começavam a ficar apagados ou descascavam, eram simplesmente repintados.

Trazendo ordem ao caos

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Imagens de “Out of the Labyrinth”, de George Salomon (c. 1957) (cortesia do arquivo do Museu do Trânsito de Nova Iorque)

A bagunça descontrolada dos sistemas de sinalização finalmente teve atenção em 1957, quando George Salomon, designer de tipografia da Appleton, Parsons & Co., fez uma proposta voluntária para a New York City Transit Authority (NYCTA), chamada “Out of the Labyrinth: A plea and a plan for improved passenger information in the New York subways” (Fora do Labirinto: um apelo e um plano para melhorar a apresentação de informações aos passageiros do metrô de Nova Iorque). Este documento, que não foi publicado, antecipa muitas das sugestões para se fazer uma revisão da sinalização do sistema de metrô que a Unimark veio a utilizar uma década mais tarde. Salomon sugeriu que fossem abolidas as diferenças entre IRT, BMT e IND, e que fossem substituídas cinco linhas principais e onze rotas subsidiárias. As linhas principais poderiam ser identificadas por cores e por uma letra, e as ramificações por uma combinação de letra e número. Desta forma, o sistema de Salomon consistia das linhas Lexington Avenue (B, azul), Broadway BMT (C, roxa), Sixth Avenue (D, laranja), Seventh Avenue (E, vermelha) e Eight Avenue (F, verde). A linha Seventh Avenue ramificava-se em outras vias, que foram chamadas de E1 a E5. Marcações semelhantes foram usadas para as outras linhas subsidiárias. Salomon propôs que o código de cores fosse usado para os trens, sinalização e mapas, para assegurar consistência e uniformidade em todo o sistema metroviário. Ele também queria padronizar a sinalização. Sua preferência era por placas em Futura Demibold – que ele considerava a fonte mais legível existente – escritas em branco sobre um fundo preto e com grandes setas indicando direção. Salomon concluiu sua proposta dizendo que “É um grande trabalho. Mas para o bem do próprio metrô e para o bem da cidade que ele serve e para as pessoas desta cidade, ele deve ser feito logo”. A única idéia de Salomon que foi aceita pela TA (abreviação de NYCTA) foi sua sugestão de um mapa com código de cores. Seu projeto de mapa do metrô, fortemente influenciado pelo famoso mapa do metrô de Londres, de Henry Beck, foi publicado em 1958. Foi o primeiro mapa oficial publicado pela TA desde o início de suas atividades, em 1953 – e o primeiro a mostrar o sistema inteiro (os mapas publicados pelo Board of Transit, predecessor à TA, foram produzidos por empresas privadas, como a Hagstrom Maps). O mapa de Salomon não era tão ambicioso quanto as idéias do “Out of the Labyrinth”. As linhas do IRT eram apresentadas em preto, as linhas do BMT eram em verde e as do INT, em vermelho. O mapa foi produzido com uma mistura de fontes New Gothic, News Gothic Bold, Standard e Times Roman – nem sinal da Futura.

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Sinal proposto por Ladislav Sutnar (1958), do “Making New York Understandable”
(Deixando Nova York Compreensível), impresso em julho/agosto de 1972.

Aparentemente, a TA fez alguma tentativa de melhorar a sinalização do sistema metroviário em 1958. Isso encorajou Ladislav Sutnar a projetar sinais de saída para as estações, porém elas não foram “adequadamente implementadas” pelo armazém de sinalização da TA – uma prévia do que a Unimark estaria a enfrentar uma década mais tarde. Não se sabe mais detalhes sobre este trabalho.

Sinalização nos anos 60

Nos anos 60, projetistas urbanistas, arquitetos e designers gráficos, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, demonstraram interesse no sistema de sinalização das cidades, estradas, vias férreas, metrôs e aeroportos. No começo da década, duas publicações, que foram divulgadas quase que simultaneamente, tocaram no assunto: Lettering on Buildings (Rotulação em Construções – 1960), de Nicolete Gray, e Sign Language for Buildings and Landscape (Linguagem de Sinalização para Construções e Paisagem – 1961), de Milred Constantine e Egbert Jacobson. Infelizmente, Gray não examinou a sinalização do sistema de transporte e Constantine e Jacobson dedicaram umas poucas frases e imagens sobre o assunto, focando-se principalmente na sinalização em nível de terra dos metrôs de Paris e Londres. A única imagem que eles tiveram de um sistema viário subterrâneo era, surpreendentemente, do metrô da Philadelphia.
Uma razão para esta lacuna é que, naquela época, os sistemas coordenados de sinalização subterrânea eram raros. Nova Iorque não era a única cidade grande a ter um metrô bagunçado visualmente. Mesmo o famoso Métro Paris era marcado por diferentes estilos de sinais que não foram controlados até 1971, quando o Métro,projetado por Adrian Frutiger e baseado na fonte Univers, foi apresentado. A única exceção para esta situação era Londres, onde a Johnston Railway Sans – projetado pelo calígrafo Edward Johnston sob ordem de Frank Pick, gerente de publicidade do London Transport – foi usada desde 1916 para sinalização, pôsters e propagandas.

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Sinalização no Oceanic Building, Heathrow (1961); Alfabeto do aeroporto, por Matthew Carter (1960). (Cortesia de Matthew Carter).

O primeiro sistema coerente de sinalização dos meios de transporte foi criado por Colin Forbes em 1961 para o Oceanic Building no Aeroporto Heathrow. Atualmente chamado de Terminal 3, o Oceanic Building foi o segundo terminal construído neste aeroporto. O sistema de sinalização de Forbes empregava painéis modulares com letras Sans Serif em preto sobre fundo branco (sendo permitido branco com fundo preto dependendo do nível da informação), além de setas. Forbes, que trabalhava sozinho na época, contratou um jovem chamado Matthew Carter (nascido em 1937) para projetar uma fonte sem serifa personalizada. O projeto, chamado Airport, foi baseado na Standard (como era conhecida a Akzidenz-Grotesk na Inglaterra), e Forbes orgulhava-se de suas formas “simples, bold e facilmente identificáveis com uma personalidade individual mas não agressiva”. O projeto de Carter tinha um peso especial, com altura-x aumentado e juntando várias letras individuais (principalmente substituindo as terminações angulares do “c”, “e” e “s” por terminações horizontais).
O resultado era muito semelhante à Helvetica Medium. Forbes reconheceu este fato anos depois no A Sign Systems Manual (Um Manual de Sistemas de Sinalização – 1970) quando escreveu: “Uma vez que esta junção produziu um novo tipo de fonte, Helvetica foi criada. A Helvetica incorpora muitas das adaptações feitas à Standard, e agora é freqüentemente usada para sinalizações sendo reproduzida diretamente pelas impressoras e fotocompositores”. Em 1960, quando o sistema de sinalização do Oceanic Building estava sendo planejado, Forbes e Carter não sabiam da existência da Helvetica. “Se nós a conhecêssemos”, disse Carter em 2007 para Alice Rawsthorn, da International Herald Tribune, “eu tenho certeza que a teríamos usado, uma vez que é muito melhor do que a fonte que eu desenhei”.
Todos os elementos do sistema de sinalização do Oceanic Building foram reaplicados em outros sistemas de sinalização dos anos 60. Em novembro de 1964, o trabalho na linha M1 (vermelha), a primeira das três que compunham a Metropolitana Milanese, estava concluído. Franco Albini e Franca Helg fizeram o projeto da estação, enquanto que a sinalização foi feita por Bob Noorda, que também foi responsável por sugerir o código de cores das três linhas do sistema. Naquela época, Noorda – um designer holandês que se mudou para a Itália em 1952 e ganhou reputação ao trabalhar como diretor de arte da Pirelli – tinha sua própria empresa de design em Milão. Seu sistema de sinalização para o metrô de Milão envolvia sinais em faixas esmaltadas modulares colocadas nas paredes da estação em intervalos iguais. Juntamente com a sinalização das plataformas, Noorda projetou os diagramas das rotas, mapa dos arredores, faces dos relógios e pôsters para cada estação. O sistema inteiro de Milão rendeu a Noorda e seus arquitetos o Premio Compasso d’Oro de 1964.

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(Da esquerda para a direita) “Studies for signs and Indicator Board in the Milan Underground” (Estudos para sinalização e painéis de informações no metrô de Milão – 1964), de Bob Noorda: uma comparação da Akzidenz-Grotesk com a Milano; O alfabeto Milano; Sistema de sinalização da Metropolitana Milano.

O lettering da sinalização do metrô de Milão era de uma fonte Helvetica modificada, desenhada pelo próprio Noorda. Por achar as variações da Helvetica ou muito pesadas ou muito leves, Noorda criou um peso intermediário. Ele também reduziu a altura das maiúsculas e das ascendentes e a profundidade das descendentes para fazer um design mais compacto. Muitos caracteres foram desenhados seguindo o Akzidenz-Grotesk: o “Q”, o “R” e o “2”, por exemplo. As letras foram desenhadas para serem brancas com um fundo vermelho matte. Os nomes das estações e os sinais de saída foram definidos em caixa alta, enquanto que os sinais informativos foram definidos com caixa alta e caixa baixa. Noorda estabeleceu um sistema de espaços para sua fonte personalizada.

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Alfabeto Rail (1964) (do A Sign Systems Manual – Um Manual para Sistemas de Sinalização)

Noorda não foi o único designer do começo dos anos 60 insatisfeito com a Helvetica como fonte para a sinalização nos meios de transporte. Em 1964, Jock Kinneir e Margaret Calvert, da Kinneir Calvert Associates, projetaram o Alfabeto Rail como parte de um abrangente sistema de sinalização da British Railways, feito em paralelo com um programa completo de identidade corporativa, da Design Research Unit (DRU). Sua fonte era uma versão modificada da Helvetica Bold, disponível tanto em positivo quanto em negativo. As letras maiúsculas, ascendentes e descendentes foram todas reduzidas, enquanto que o “Q” e o “2” permaneceram como na “Standard”. As letras individuais – assim como as setas e o novo logotipo da British Rail – foram feitos com pastilhas individuais para artesanato, para facilitar a montagem e o espaçamento. A identidade da British Rail, incluindo o alfabeto Rail, foram revelados em 1965.

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Alfabeto Schipol (1965) usado em um ônibus (retirado do A Sign Systems Manual – Um Manual para Sistemas de Sinalização).

O trabalho no Aeroporto Schipol, de Amsterdam, projetado por M. Duintier e Kho Liang, começou em 1962. O projeto do sistema de sinalização foi levado por Benno Wissing, da Total Design, que usou uma versão alternativa da Standard – ascendentes e descendentes chapadas – como fonte. Com exceção de todas as identificações de gate, os sinais eram em caixa baixa. As cores eram uma combinação de preto e branco com fundo amarelo ou verde. O sistema foi publicado em 1965, mas o aeroporto não o inaugurou até 1967.
No mesmo ano em que foi inaugurada a Linha Vermelha da Metropolitana Milanese, os planos para modernizar o sistema metroviário de Boston foram anunciados. A recém-criada Massachusetts Bay Transportation Authority (MBTA) cedeu o contrato para a renovação da estação em Janeiro de 1965 para a Cambridge Seven Associates, uma firma multidisciplinar de arquitetura e design liderada pelo arquiteto Peter Chermayeff. Os parceiros de design da empresa, Ivan Chermayeff e Thomas Geismar, eram responsáveis pelos gráficos das estações. Eles criaram um novo símbolo para o sistema de Boston (um T sans serif preto em um círculo), definiram um código de cores para suas quatro linhas (e as renomearam como Vermelha, Azul, Laranja e Verde), projetaram um mapa diagramado inspirado em Beck e estabeleceram um estilo uniforme de tipografia para toda a sinalização dos sistemas de ônibus e metrô.Os sinais em esmaltado foram cortados no meio horizontalmente, com letras brancas em um fundo colorido no topo, para o nome de cada estação, e com letras pretas em fundo branco abaixo, para informações adicionais sobre cada parada. A fonte, usada nos mapas e na sinalização, foi a Helvetica Medium. “A razão da escolha da Helvetica é meio vaga”, disse recentemente Geismar, “mas eu me lembro de que nós ficamos muito animados em ter uma versão machine-set, e sentimos que esta abertura era adequada a nosso esforço em simplificar e tornar mais claro o sistema de trânsito do MBTA. Além disso, como parte do programa, eu projetei o “T” no círculo para identificar e renomear o sistema, e isso resultou num “T” muito simples, semelhante à Helvetica”. A sinalização do MBTA foi publicamente apresentada em agosto de 1965, mas a primeira estação reformada – Arlington Street – não foi inaugurada antes de outubro de 1967. Esse foi o primeiro sistema de sinalização para meios de transporte a utilizar a Helvetica sem modificações.

A NYCTA e a Unimark International

Ao mesmo tempo em que Milão estava inaugurando sua primeira linha do novo sistema de metrô e Boston estava revisando seu sistema “T”, o metrô da cidade de Nova Iorque ainda estava tropeçando sem sair do lugar. Mas a World’s Fair de 1964/1965, em Flushing, Queens, pressionou a NYCTA a melhorar sua imagem e seus gráficos informativos. Eles encomendaram um novo logotipo para a agência Sundberg-Ferar, uma empresa de design industrial responsável por projetar um novo carro do metrô, e que criou mapas em fitas especiais (com caracteres Futura) para usar na Flushing Line nº 7. A TA também decidiu criar um concurso para projetar um novo mapa.
O concurso de mapas de 1964 era aparentemente idéia de Len Ingalls, diretor de informações públicas e relações com a comunidade da agência, que estava ávido por ver se o código de cores usado no mapa do metrô de Londres poderia ser aplicado ao mapa do metrô de Nova Iorque. O concurso – julgado por Harmon H. Goldstone, chefe da New York City Planning Comission, e Jerry Donovan, cartógrafo da revista Time – teve apenas nove concorrentes. Quatro destes receberam prêmios de US$ 3.000, mas nenhum foi escolhido como vencedor. O melhor trabalho, de Raleigh D’Adamo, simulava o sistema de código de cores do metrô de Londres, mas foi considerado “complexo demais para uso geral”. Goldstone disse mais tarde que não houve nenhum vencedor “porque um bom mapa não pode ser criado a partir de um sistema sem precisão nem ordem intelectual”. No rastro deste desastre, o professor Stanley A. Goldstein, do curso de engenharia da Hofstra University, foi contratado como consultor em janeiro de 1965 para criar um mapa que iria finalmente resolver o problema de código por cores do sistema de metrô da cidade de Nova Iorque. Seis meses mais tarde, ele submeteu um relatório de 39 páginas com o título “Methods of Improving Subway Information” (Métodos para Melhorar as Informações do Metrô), que foi além das idéias para o novo mapa, sugerindo nomes para trens, informações nos carros e informação nas estações. As recomendações de Goldstein não foram seguidas imediatamente, mas dispararam os eventos que levou a NYCTA a contratar a Unimark International.

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(da esquerda para a direita) Cartaz pintado à mão em uma estação da IRT (c. 1965), do Subway Style.

O novo metrô de Milão finalmente foi reconhecido pela comunidade de designers dos Estados Unidos em 1965. O designer industrial William Lansing Plumb, na edição de Setembro/Outubro de 1965 da Print, comparou os sistemas de metrô de Londres, Milão e Nova Iorque – mas não de Boston. Ele descreveu este último como “sombrio, sujo e parecido com uma favela” reclamando que a beleza original das decorações de mosaico de Heins & LaFarge e Vickers foram cobertas no decorrer das décadas por sujeira e fuligem, assim como por sinalização de propagandas. Ele também criticou o novo logotipo da TA pela Sundberg-Ferar. Em contraste, ele elogiou os gráficos de Noorda – incluindo seu uso de uma “fonte sem serifa personalizada” – do metrô de Milão, sugerindo que estes poderiam ser aplicados à cidade de Nova Iorque. Sua sugestão provou ter fundamento.No final de 1965, Massimo Vignelli, um designer gráfico de Milão, mudou-se para Nova Iorque. Ele teve que ir aos Estados Unidos para chefiar um escritório da Unimark International, uma consultoria de design aberta naquele ano. A empresa era subsidiária da Vignelli and Ralph Eckerstrom, antigos diretores de design da Container Corporation of America (CCA). Os dois homens se conheceram em Chicago em 1958 quando Vignelli era professor no Institute of Design no Illinois Institute of Technology e ambos eram companheiros de trabalho na Moholy-Nagy e compartilhavam a mesma filosofia de design. Ao formar a Unimark eles pretendiam levar ao mercado norte-americano o design modernista da Europa. Juntamente com Vignelli e Eckerstrom, os outros fundadores da empresa eram Bob Noorda, Jay Doblin, James K. Fogleman e Larry Klein. Herbert Bayer, que era da Bauhausler, trabalhou como consultor, trazendo reconhecimento para a Unimark.
Após alguns meses da chegada de Vignelli em Nova Iorque, a Unimark ganhou uma tarefa grande: em maio de 1966, a NYCTA, por recomendação do Museu de Arte Moderna, contratou a empresa para avaliar a recomendação e aplicar o relatório do Prof. Goldstein – novos mapas significavam nova sinalização. A recomendação veio de Mildred Constantine, curadora associada do departamento de arquitetura e design do MoMA. É provável que a TA tenha escolhido Constantine por seu interesse de longo tempo em sinalizações e seu íntimo conhecimento em design gráfico. Ela foi a curadora da exposição “Signs in the Street” (Sinalização nas Ruas), no MoMA em 1954, e posteriormente foi co-autora do livro Sign Language for Buildings and Landscape (Linguagem de Sinalização para Construções e Paisagem). Ela estava na mesa de diretores do AIGA e era familiarizada com empresas de design gráfico, especialmente a recém-inaugurada Unimark. Constantine havia conhecido Vignelli e Eckerstrom em 1959, quando os três foram jurados no Art Directors Club, na competição anual de Chicago. E, o mais importante, ela conhecia os gráficos de Noorda na Metropolitana Milanese por ter trabalhado, em 1964, no comitê norte-americano de seleção do 13º Triennale di Milano. A Unimark tinha os contatos e a experiência.

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(em sentido horário, a partir do topo) Estudo de Bob Noorda, em 1966, do fluxo de tráfego da Grand Central Station; rascunhos da sinalização proposta para o metrô; sistema de sinalização modular (cortesia de Bob Noorda)

Com a contratação da Unimark, parecia que a TA finalmente tinha percebido a necessidade de arrumar a situação do metrô. Mas a tarefa era curta – a Unimark deveria entregar o relatório em setembro de 1966 – e tornou-se insatisfatória. No verão, Noorda voou para Nova Iorque para tocar uma pesquisa detalhada do fluxo de tráfego em cinco estações chave de metrô: Times Square, Grand Central Station, Broadway/Nassau, Jay Street e Queensborough Plaza. Anteriormente, a NYCTA enviou a ele plantas arquitetônicas de cada estação, mas eles não estavam no mesmo fuso-horário e tinham dificuldade em coordenar o trabalho. Noorda levou três semanas fazendo um rastreamento dos caminhos dos passageiros nestas estações para poder encontrar os pontos essenciais de mensagem – entrada/saída, transferência – para cada sinal. Ele traçou pontos de decisão em um diagrama de árvore. E, como em Milão, ele viu os sinais em perspectiva para testar sua legibilidade. Ele e Vignelli criaram, então, um sistema modular de sinalização com diferentes componentes para as setas, designação de rotas – usando o código de cores proposto por Goldstein – e informações dos trens. O texto era preto em um fundo branco, e a fonte era a Standard. Três tamanhos de fonte foram definidos para distinguir diferentes níveis de informação. Um sistema de suporte modular para os sinais – nos quais eles eram encaixados em canais de metal preto suspensos do teto por escoras pretas – foi criado porque a TA insistiu que nenhuma mudança estrutural poderia ser feita nas estações. Noorda retornou a Milão para produzir um protótipo dos sinais. Então, de acordo com o crítico de arquitetura Peter Blake, Vignelli e Noorda fizeram sua apresentação e foram “agradecidos e, aparentemente, esquecidos”.

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Combinação de lettering pintado à mão (primeira frase) e em stêncil de silkscreen (1969) – cortesia do Arquivo do Museu de Trânsito de Nova Iorque.

A TA ficou satisfeita com os conselhos da Unimark, mas nada além disso. Eles não tinham dinheiro suficiente para pagar a Unimark para que esta fizesse um manual completo de design ou pelo menos uma explicação do sistema modular, e falhou em não pedir um documento de trabalho. Ao invés disso, a TA pareceu levar adiante as propostas de sua própria maneira, usando seu armazém de sinalização. O resultado era, segundo palavras de Vignelli, “a maior bagunça do mundo”. O Bergen Street Sign Shop da TA ignorou o sistema modular, interpretou erroneamente a faixa preta no topo dos desenhos (que indicava o canal de metal para segurar os sinais), fizeram a escrita manualmente ao invés de fotomecanicamente e não fizeram o espaçamento entre as letras de acordo com Vignelli. “Nunca nos ocorreu que eles pudessem aplicar as propostas em seu próprio armazém de sinalização”, disse Vignelli. “Nós podemos dá-los alguma instrução, mas não o suficiente. Sempre que perguntávamos sobre o andamento do projeto, eles pareciam muito otimistas. Nós nem éramos autorizados a inspecionar”. Os novos sinais foram em sua maioria instalados sobre os antigos, criando mais confusão ao sistema do metrô. Toda a confusão entre os “pintores de sinais” da Bergen Shop – como Vignelli os chamou – e os designers da Unimark refletiu as diferenças entre as expectativas dos designers e dos artesãos. Os primeiros estavam interessados em sistemas de sinais, enquanto que os últimos tinham a intenção de fazer sinais.
A falta de dinheiro era a principal justificativa para a TA recusar que a Unimark supervisionasse a implementação de suas recomendações de sinalização, mas muitos outros fatores provavelmente também interviram: inércia burocrática, regras sindicais e forças políticas externas. Certamente a gerência da TA ficou receosa em enfrentar a União dos Trabalhadores do Transporte e a União para a Amalgamação do Transporte na época da greve de 12 dias dos trabalhadores do trânsito que parou Nova Iorque em Janeiro de 1966.

Parte 2 , parte 3.

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Paul Shaw nasceu em Ann Arbor, Michigan, em 1954. Recebeu o título de bacharel em American Studies na Reed College em Portland, Oregon e um título de mestre em American History na Columbia University em 1978. Apesar de não ter tido um treinamento formal (exceto aulas de arte comercial no colegial), é designer gráfico – com o nome Paul Shaw/Letter Design – especializado em caligrafia, lettering, tipos e tipografia desde 1980. Sua carteira de clientes por todos estes anos já incluiu a Clairol, Campbell’s Soup, Origins, Lord & Taylor, Avon, Port Authority of New York & New Jersey, Departamento de Relações Culturais da Cidade de Nova Iorque e diversas editoras, agências de propaganda e empresas de design. Através de algumas agências de propaganda e empresas de design ele fiz trabalhos para a CBS, NBC, Barbie, World Trade Center e Cinzano. Desde 2002, tem passado mais tempo fazendo pesquisas e escrevendo sobre design e menos tempo praticando-o. Mas antes disso seu trabalho ganhou prêmios do Art Directors Club, AIGA, Type Directors Club, revista Print e outros. De 1995 a 2001 foi parceiro da casa de distribuição de tipos LetterPerfect, para a qual desenhou fontes como Old Claude, Bermuda, Kolo e Donatello. Projetou uma fonte corporativa para a Origins, que raramente foi usada.

Atualmente é professor e historiador de design (apesar de que, se alguém precisar de um calígrafo ou handlettering, pode contar com ele). Ensinou caligrafia na Parsons School of Design desde 1985 e história do design gráfico na School of Visual Arts desde 2000. Escreveu para a Fine Print, Print, Baseline, Design Issues, AIGA Voice, Letter Arts Review e seu predecessor Calligraphy Arts Review. Seus artigos mais importantes foram sobre o uso da caneta-pena, a caligrafia de Bartolomeo Sanvito, o epitáfio de Poggio Bracciolini, uma inscrição no Forum Trajan em Roma, o Quattrocento Rome e a história da Helvetica no sistema de metrô na cidade de Nova Iorque.

Juntamente com Peter Brain, foi curador da mostra Blackletter: Type and National Identity na Cooper Union em 1998. Eles também foram responsáveis por uma monografia e um catálogo que acompanharam a exibição. Depois disso, escreveu e projetou uma edição especial do jornal da Wasington Calligraphers Guild dedicada aos aspectos caligráficos do tipo blackletter. Mais recentemente, Letters from New York 2 (2006) foi dedicada inteiramente à sua tarefa de buscar letras na cidade de Nova Iorque. Continua procurando, e já tem mais de 15.000 imagens nas quais irá provavelmente se basear para escrever um livro sobre este assunto. Mas, primeiro, precisa terminar um livro sobre as “raízes dos tipos”, previsto para 2011.


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