PARTE 1
Aloha!
Há muito anos, numa das várias vezes que quebrei um dos braços, ao estar esperando para colocar gesso lembro de ver pela primeira vez uma matéria sobre um jovem empreendedor, CEO de uma empresa que valia 6000% a mais do que quatro anos antes, onde sua importância era comparada a Henry Ford e Bill Gates.
Tratava-se de Jerry Yang (e David Filo), fundadores do ‘catalogador’ e indexador de páginas na internet Yahoo!, um dos sobreviventes do estouro da bolha da internet no ano 2000 e que começava a enfrentar a fusão de TimeWarner e AOL. Na época até se especulou que o Yahoo compraria a Disney! Apesar de alguns erros em informações dadas, vale a pena ler a matéria. Só clicar na imagem e ir até a página 114.
Bem, mais de 13 anos se passaram desde que saiu essa matéria, e o Yahoo! passou de inovador e relevante a “um dos concorrentes do Google”. Encurtando a história: os fundadores sairam da direção da empresa, entrou uma nova CEO que não conseguiu fazer o que se esperava, até que em julho de 2012 eles contratam Marissa Mayer, tirando a moça do Google e a colocando para liderar o Yahoo!. Desde então, em pouco mais de 14 meses na direção, Marissa tem realizado uma grande revolução na empresa: encerrou uma dúzia de empresas/serviços que não davam lucro ou não eram relevantes para o futuro da empresa, comandou pessoalmente a compra de 21 startups (entre elas o Tumblr) e devolveu o orgulho de seus funcionários. Além disso, está comandando o redesenho de serviços e apps da empresa, buscando transformar o Y! numa empresa móvel. E a dona Mayer já mostrou todo seu “googísmo” no novo Yahoo! Mail.
E no meio disso tudo era quase que certa uma mudança no logotipo da empresa, visto que ele permaneceu quase intocável por mais de 17 anos e que não combinava/comunicava os novos ares, principalmente com seus novos apps para smartphones. Ainda mais sendo uma demanda de usuário (veremos isso mais abaixo). E de fato, o redesign veio no dia 4 de setembro/13.
• O aposentado logo dos anos 90 •
E antes de mostrar o novo logotipo, durante 29 dias eles mostraram 29 estudos que, provavelmente, foram produzidos durante o processo de redesenho.
E não apenas isso, no dia do lançamento eles divulgaram um vídeo mostrando o “craft behind our new logo”.
E antes que você diga: sim o logotipo está escrito em Optima. Editada e escalopada. E sim, está cheio de problemas esse lettering. O pessoal do Fonts In Use fez um ótimo e curto texto sobre esses problemas.
O trabalho foi feito “em um final de semana”, pela própria Marissa Mayer, Bob Stohner e alguns assistentes.
E é isso.
Opinião
O logotipo poderia ser melhor, muito melhor. Contudo, representa de forma infinitamente melhor o momento do Yahoo do que o antigo. Era necessária essa mudança/atualização, e ela veio. Não da melhor forma possível, mas veio. Do males, é menos pior. Apenas pense no novo Yahoo! Mail com aquele logo “90’s of David Carson”? Não dá.
Não vejo o Design Gráfico como um fim em si mesmo, mas como uma ferramenta de negócios e gestão de marca. Acredito, hoje, que podemos ver, pensar, trabalhar e analisar o Design de três formas:
1) Sob o ponto de vista artístico/técnico;
2) Sob o ponto de vista dos negócios;
3) Sob o ponto de vista “artísco-negócios”.
Esse meu comentário é um pouco com o olhar 3: o logo não é tão bonito, sofre de problemas técnicos, mas está anos-luz a frente do antigo, que o Fast Co.Design genialmente chama de “clown logo”; comunica melhor o novo momento da empresa e própria empresa em si (de alta tecnologia, não um rancho de férias no oeste estadunidense) e se integra melhor as novas interfaces do Yahoo!. Funciona.
Como disse, poderia ser melhor. Poderia, talvez, ser mais ousado se levarmos em consideração os 29 dias de espera e a ansiedade que aquilo criou. Poderia ser um logo que tiraria nosso fôlego e nos daria aquele sentimento de “como queria ter feito isso”. Não é. Mas mesmo assim não deixa de ter seus méritos e de cumprir seu papel. Ainda mais se levarmos em consideração que ele foi feito num final de semana e com direção da CEO da companhia.
Conclusão
Tirando a forçação de barra do vídeo, a falta de conhecimento de colocar as letras dentro de um grid, do espacejamento duvidoso de AHOO e das letras O gigantescas, gosto do logo. Sério! No fim das contas, ele é simpático, tem algum mérito. Por que digo isso? Porque minha base de comparação está sendo o antigo logo. Seria bem difícil ficar pior.
Também gosto da decisão de colocar volume no lettering (gosto da decisão, não da execução). Por que? Bem, quando todos estão ficando flat, incluindo o próprio Google e seu logo, o Yahoo! vai lá e fica volumoso. Ousado!
Manteve alguns traços da origem. Continua com um ar excêntrico e divertido sem ser banal. Aliás, falando sobre diversão: a cada dia, o ponto de exclamação trará uma nova animação, algo como o Google faz com seus doodles.
Gosto sempre de dizer que um logotipo “não faz verão sozinho”. Olhem os novos apps, redesign do sites, Yahoo! Mail. Existe um ecossistema sendo construido em torno desse logotipo. E analisando o todo, é uma ótima evolução.
Entretanto, tenho comentários sob o ponto de vista 1. Evidentemente que não é só porque o logo funciona e é melhor que seu antecessor que não podemos/devemos falar sobre problemas técnicos, sobre processo e sobre alguns outros detalhes que, não apenas o Yahoo!, mas muitos de nós estamos fazendo para “justificar” nossos trabalhos.
PARTE 2
O novo logo: olhar técnico
Antes de revelar seu novo logotipo, o Yahoo! anunciou uma espécie de pré-lançamento: durante 29 dias mostrou diferentes versões do logo da empresa até que no 30º foi revelado o novo logo. Confesso que achei interessante a iniciativa, visto que redesigns de marcas mundiais tendem a ser difíceis de ser aceitos, ainda mais nos tempos de internet, na qual todas as vozes podem ser ouvidas. A Gap que o diga. Logo, diminuir esse impacto foi talvez o maior trunfo dessa estratégia. Além disso, ela entregou algumas das decisões sobre o design que o Yahoo! tomou: ainda um logo tipográfico, ainda utilizando o púrpura como cor e a presença do ponto de exclamação.
É interessante observar que segundo palavras do vice presidente de Brand Creative do Yahoo!, Bob Stohner, ao site Fast Co. Design, apesar da nova estratégia de condução da empresa que Marissa Mayer colocou pra funcionar, principalmente com o foco no mobile e no redesign de seus apps e serviços, não estava previsto um redesign do velho logo. Isso mudou, ainda segundo Stohner, depois que eles receberam feedbacks dizendo que o logo não combinava mais com o design dos novos apps. E como disse o Co.Design, “quando seus usuários dizem que tua marca não bate com seus produtos/serviços, é hora de mudar.”
Foi o que o Yahoo! fez. Não faço ideia de quantos emails eles receberam falando sobre isso, mas deve ter sido o suficiente para mobilizar a CEO da companhia para buscar uma solução.
O único serviço do Yahoo! que uso é o Email, ainda assim redirecionando tudo para outra conta. Mas é interessante ver que enquanto não houve esses ventos de mudança na empresa, com nova abordagem de seus serviços mobile, principalmente sob o ponto de vista do design e interfaces, ninguém falou sobre o logotipo da empresa. Ela era ruim, mas ninguém comentava. Ninguém se importava. A partir do momento que a companhia reage e melhora sua oferta, passa haver uma discrepância entre a experiência do usuário com o ídolo da marca, seu logotipo.
Quem disse que somente pequenas empresas tem problemas de comunicação com suas marcas, não é mesmo?
Então com a decisão de reformar o logotipo, Marissa Mayer e Bob Stohner começaram a se mexer. Elegeu-se alguns pontos que o novo logotipo deveria responder (que vocês podem ver no blog da Marissa Mayer), e um deles me chamou muito a atenção:
Queríamos que houvesse uma consistência matemática para o logotipo, realmente puxando-o para uma marca coerente.
E, ao meu ver, é aqui que começam o problemas técnicos do logotipo do Yahoo!.
Em 2012 tive o prazer de fazer um curso sobre tipografia com Fabio Haag em SP, onde ele disse a mais célebre frase daqueles dias enquanto falava sobre compensação óptica para as letras: na tipografia o óptico é mais importante do que a matemática. E isso acontece simplesmente porque nossos olhos são extremamente sacanas com a gente.
Por conta disso a tipografia é cheia de compensações que matematicamente estão erradas, mas que ao olho humano se tornam corretas. Falei um pouco disso no meu artigo sobre o redesign da identidade visual da Nivea, até mostrando alguns exemplos.
E muitos designers (muitos mesmo), desconhecem isso. Pior: pensam que tudo ‘deve estar milimetricamente alinhado’, e ai me colocam as letras da fonte dentro de linhas, percebem que muita coisa matematicamente não bate e saem editando tudo.
E o problema nem está no editar, está em editar errado. E foi exatamente o que o pessoal do Yahoo! fez: pegaram a Optima e ‘”buscando por consistência matemática para o logotipo”...
“Aqui está o modelo do que fizemos, chamando um pouco do que era cool/matemático.” Marissa Mayer
A falácia do grid
Procurar por “consistência matemática” em uma tipografia é tão errado que não dá pra acreditar que ninguém lá dentro falou isso pra ela. Ritmo, harmonia, consistência na formação de logotipos são feitos exatamente através da compensação óptica, que é uma quebra matemática.
Mas se não bastasse, Marissa ainda encomenda um vídeo com seu estagiário para mostrar o “craft behind our new logo”. Tanto essa frase como o vídeo, sugerem que as letras foram desenhadas, o que é, no mínimo, má fé. Caramba, o logotipo é todo baseado na Optima, as duas letras O não sofrerem nenhuma alteração. E ai você cria um vídeo dando a entender que o desenho disso é seu? Pior: chama isso de craft, que no inglês indica uma atividade que envolve a habilidade de fazer coisas com a mão.
Vídeo, textos, crafts e principalmente grids. Tudo uma tentativa de justificar as decisões de design no trabalho. Mais que isso, uma tentativa de trazer uma percepção de “trabalho duro” para o resultado. E a grande desgraça disso tudo é que, por ser uma estratégia usada por uma grande empresa, isso valida de alguma forma esse tipo de comportamento, tão comum entre designers.
O fato de se ter um logo somente tipográfico, não é demérito nenhum. Ao menos não deveria. O trabalho de uma equipe de design ao desenhar a identidade visual de uma marca vai muito além do logotipo. Se trata de uma identidade, de um sistema composto por vários atores. O papel de uma equipe de design, ou mesmo de um único designer, é de entender um contexto, uma problemática muito maior e de sugerir uma ou varias soluções, seja ela um símbolo com desenho extremamente elaborado ou um nome escrito em Comic Sans!
Se sou contra o uso de grids/malhas construtivas? Claro que não!
Farei o mesmo comentário que já fiz outras vezes: é um processo, as vezes necessário, as vezes não tão necessário. Alguns designers não conseguem trabalhar sem a malha construtiva; outros se sentem presos. A questão não é o uso do grid em si, mas da tentativa de usá-lo em favor da apresentação do trabalho, buscando algum status com isso ou mesmo tentando vender a ideia (seja para o cliente ou para o mercado) de você se esforçou muito para desenhar aquilo.
No caso do Yahoo!, o que aparenta é exatamente isso: mostram que não foi simplesmente uma escolha pela Optima e pronto, mas que foi a Optima e um processo monstruoso e extremamente doloroso de redesenho total, usando toda a inteligência matemática (!) da equipe de design pra isso.
Dá para entender esse tipo de comportamento, pois quem de nós nunca ouviu o famoso “mas é só isso” no momento de apresentar algo? Contudo, não dá para aceitar.
Devemos usar o exemplo do Yahoo! para combater esse tipo de comportamento. O trabalho da equipe de design não pode ser simplesmente desenhar. Eles tem que entender do negócio, ajudar o cliente na condução da marca, na busca por encontrar seus reais valores, refletir seu posicionamento em outras frentes que não seja a identidade. E, principalmente, trazer o cliente para esse processo. Trabalharem juntos na busca da melhor solução (posso ser queimado em praça pública, durante um N Design, ao dizer isso).
Até porque, o cliente não contrata você apenas pela sua criatividade, ele contrata sua capacidade de análise, sua capacidade de entendimento, de síntese, de atendimento, de conhecimento e, principalmente, de resposta.
Se a solução é o nome em Helvetica, seu trabalho não é colocar a Helvetica dentro de um monte de linhas e círculos, mas é de guiar seu cliente pelo seu processo de análise e tomada de decisão para que ele entenda o porquê do nome escrito em Helvetica ser a solução. Se ele concorda ou não, é outra história. E se não concordar, provavelmente ele terá porquês para isso. E, se você souber conduzir a conversa e estiver ali comprometido com a marca do seu cliente e não com sua vaidade (e claro, o cliente também), vocês decidirão o que for melhor para o projeto, qua até pode ser buscar por novas alternativas. Mas tudo com direcionamento. Ou seja, buscar novas alternativas mas sabendo quais são essas alternativas, e não por trabalho especulativo, algo que também sou contra.
Enfim… o que acham disso tudo? Comentários abertos 🙂
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